terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Vocês os conhecerão pelos seus frutos...




            “Deem fruto que mostre o arrependimento!”, disse João Batista aos fariseus que foram ser batizados. Ao dizer isso, ele estava distinguindo um costume simbólico de uma vivência espiritualmente verdadeira. O homem que ele anunciava fez o mesmo: em sua última semana de vida em corpo humano, andando por Jerusalém, Jesus amaldiçoa uma figueira que tinha folhas, e não frutos (Marcos 11). Com os acontecimentos posteriores no templo, Jesus ensina aos discípulos que os religiosos haviam se tornado como figueiras cheias de belas folhas, mas nenhum fruto, e que, portanto, seriam lançados ao fogo. Muita aparência, muita liturgia, muitos hábitos; o coração vazio e a mente perversa.
           
Há outra maneira pela qual Jesus trata a metáfora do fruto. Além de comparar o hipócrita à árvore sem fruto, ele também a compara com árvore de maus frutos. Jesus ensina que o fruto é evidência infalível e direta da espiritualidade. “A árvore boa não pode dar maus frutos; a árvore má não pode dar bons frutos”. E mais: “Vocês os conhecerão pelos seus frutos”. Jesus ensina diversas vezes que todo tipo de aparência piedosa é vã se ela for inconsistente com o fruto. Esse ensino deve nos disciplinar constantemente, pois também somos fanáticos por religiosidade externa. Observamos programas, performances religiosas, ministérios que trazem estatísticas, carisma pessoal, música bela, horários e frequência de oração e leitura bíblica, assiduidade na Igreja. Manter uma aparência de bom crente é muito fácil. Muitos acreditam que são crentes corretos por cumprirem uma série de normas protocoladas pela cultura de sua Igreja ou denominação. Jesus, entretanto, observará o fruto. Se ele encontrar maus frutos, ele destruirá a árvore má de vastas folhagens, assim como destruiu o magnífico templo de Jerusalém no devido tempo. Pois “O homem vê a aparência, mas o Senhor vê o coração”.
           
Vamos investigar mais a fundo o que é esse tal fruto. Como já foi dito, o fruto é a evidência externa da espiritualidade real do coração. O fruto é o reflexo da alma. E a melhor exemplificação que temos dos frutos é a que Paulo faz em Gálatas 5. A lista é famosa, mas há pouca meditação sobre ela. Além disso, o fruto da carne, descrito antes do fruto do Espírito, passa despercebido muitas vezes. E eles são mutuamente excludentes. Um crente não pode conviver com ambos sem sentir o conflito de Romanos 7. Além disso, deveríamos questionar por que Paulo apresenta essa lista aos gálatas. Em toda a carta, o apóstolo critica veementemente a confiança da Igreja em performances religiosas. Os judaizantes ganharam muito terreno na região da Galácia. Por essa carta, Paulo demonstra que é possível realizar rituais e estabelecer hábitos cristãos e, mesmo assim, estar espiritualmente morto. É possível cumprir todo o protocolo de um meio social cristão, mesmo o nosso – participar dos programas, ler a Bíblia, orar, jejuar, assistir aos cultos, chorar nas ministrações – e, no fim, ser condenado ao inferno.
           
O fruto da carne é assim descrito (segundo a NVI): imoralidade, impureza e libertinagem. Termos sinônimos, que levam ao significado do termo grego “porneia”, que abrange todas as práticas sexuais proibidas por Deus, bem como o desejo e as intenções de praticá-las. Idolatria e feitiçaria. Muito comuns nas religiões de mistério gregas; significam, mais amplamente, a inclinação por envolver-se com deuses falsos, seja qual for o objeto que decidimos deificar em nossos corações. Ódio, discórdia, ciúmes, ira, egoísmo. Nossa relação com os irmãos. Sentimentos e atitudes erradas, que demonstram orgulho e adoração própria. São problemas pouco combatidos na Igreja, o que causa a desunião e o esfacelamento de toda a fraternidade, e refletem total insubmissão a Cristo; vontade de ser o senhor da própria vida. Manifestações descontroladas de ira, principalmente, são tão comuns que todo mundo apenas entende e suporta, quase nunca repreende. Entretanto, quem vive com ira desenfreada contra seus irmãos está morto. Dissensões, facções e inveja. Também são problemas de fraternidade, precisamente a divisão da Igreja em torno de líderes ou ideias. A inveja é especialmente comum entre líderes, tanto quanto era no tempo de Paulo, e é um dos fatores mais causadores de divisões. Embriaguez, orgias e coisas semelhantes. A completa entrega de si mesmo a práticas que o senso de autojustiça proibiria, desistência da justiça e dissolução de si mesmo no pecado. Se há coisas semelhantes, significa que a lista não é taxativa, pois o pecado tem múltiplas manifestações. Há outras listas em outros textos (ex: 1Coríntios 6). Aqueles que praticam essas coisas não serão salvos, diz Paulo.
           
Agora, passemos ao fruto do Espírito. Amor. O princípio de toda virtude, a essência da vida cristã, o norte de qualquer mandamento. Amor a Deus e amor ao próximo, a síntese da santidade. Certamente, o amor é o centro do outros aspectos do fruto do Espírito. Alegria. Um cristão demonstra alegria devido ao reconhecimento e espanto diante da graça de Deus e do seu amor. Quanto mais um crente desvenda as inumeráveis bênçãos de Deus para si, mais alegre ele se torna. Mesmo em calamidade, em circunstâncias difíceis e desagradáveis, a alegria do Espírito está dando suporte ao crente, pois nenhuma ocorrência abala o fundamento imutável da alegria – o amor de Deus. Paz. Tranquilidade diante das frivolidades da vida, domínio emocional da angústia. Significa também a paz entre irmãos, o oposto da discórdia, egoísmo e esses pontos do fruto da carne já comentados. Resolução de conflitos e problemas em amor. Longanimidade (paciência). Associada ao aspecto interior da paz; serenidade e capacidade de aguardar o tempo certo para o cumprimento da vontade de Deus. Evidência do “suportem-se uns aos outros em amor”. Amabilidade, bondade. Direta aplicação do amor em atos e sentimentos, demonstração de humildade e atração para receber amor de volta, prazer em agradar o próximo. Fidelidade. Submissão aos mandamentos de Deus dados na sua aliança, cumprimento da própria palavra, falar e praticar a verdade. Opõe-se à palavra dúbia e à mentira. Mansidão. Domínio do ânimo, contenção da ira, disciplina das emoções e dos atos praticados em momentos de raiva. “Quando ficarem irados, não pequem” (Salmo 4:4). Contrária à gritaria e à vazão injusta ou desproporcional da raiva contra o próximo. Domínio próprio. Extensão do princípio da mansidão a todas as outras tentações. Mansidão tem direta relação com a ira; domínio próprio abrange a ira e todo o resto. Significa a resistência ao impulso pecaminoso, seja qual for – prática sexual ilícita, roubo, sentimentos de ódio ou inveja, explosão de raiva e agressão, mentira e tudo o mais.
           
Paulo diz claramente que a carne e o espírito existem em conflito nos crentes. Todos nós lutamos contra os impulsos da carne e procuramos submeter-nos ao espírito. O que conta é quem de fato domina. Se um crente é dominado pela carne, ele não é verdadeiro crente. É fácil rejeitar falsos irmãos que vivem em práticas sexuais pecaminosas, “embriaguez, orgias”, mas o fruto da carne deve ser combatido holisticamente. Ódio, inveja, ira, divisões, egoísmo – tudo isso é tão condenável quanto os pecados que consideramos erroneamente como mais escandalosos. A ausência de fruto do Espírito infalivelmente significa prevalência da carne. Poucos que consideramos crentes podem evidenciar o fruto espiritual completo. Frequentemente vemos irmãos com falta de amor, com postura triste constante, angustiados inconsolavelmente com a vida, imediatistas (pessoalmente, esse problema é um que me afeta), cultivando inimizades, sem controle dos ímpetos de raiva, falando “sim” e pensando “não”. A Igreja deve exortar-se mutuamente quanto à falta de fruto do Espírito. Não espere que alguém caia em um pecado flagrante e escandalizante para então preocupar-se com a santidade do irmão. Também não tolere o irmão que não aceita repreensão, que se recusa a mudar o cultivo do fruto errado.
           
Lembrem-se de que o argumento de Paulo é que alguém perfeitamente cumpridor de costumes sacros pode ser um cultivador do fruto da carne. Como Igreja, precisamos ser sábios para não criticarmos alguém pela aparência (nem para o bem nem para o mal), e não pensarmos em nós mesmos como santos pelos critérios errados. Jesus era a perfeita árvore com fruto espiritual, mas foi crucificado por não ter “folhas”, não cumprir a expectativa pública e errada da aparência de piedoso, e muito menos de rei messiânico. Tim Keller diz que “capacidade ministerial não significa maturidade espiritual”. Uma Igreja que se torna uma figueira cheia de folhas, mas sem frutos, torna-se não a Nova Jerusalém, mas a velha, que matou Jesus. São como os gálatas, a quem Paulo diz “Ó insensatos, quem os enfeitiçou?”. Jesus adverte: Vocês os conhecerão pelos seus frutos – o bom e o mau.

André Duarte

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