terça-feira, 7 de maio de 2013

Testemunho e evangelismo



         Bem, lá vamos nós de novo para esse tema. Creio que ainda não falei muito sobre a questão do testemunho, e é um ponto que causa dúvidas. Embora muito tenha sido dito sobre evangelismo, ainda há aquela dúvida: como, exatamente, eu devo evangelizar se eu não sou um missionário viajante? Meus outros posts falaram bastante sobre o conteúdo da mensagem de evangelismo, e não quero ser repetitivo. Quero focar aqui no aspecto mais prático, pois há várias doutrinas discrepantes sobre o “como”. Algumas pessoas pensam que todos os crentes têm a obrigação de fazer proclamações programadas sobre o evangelho. Isto é, cada crente deve fazer em seus círculos sociais a mesma coisa que missionários no estrangeiro fazem: chamar a atenção, reservar um tempo e falar sistematicamente sobre o evangelho. Outras pessoas são mais moderadas, entendendo que crentes que não fazem missões não precisam pregar nada, mas apenas viver.

            O problema com o primeiro ponto de vista é que ele não tem muito fundamento bíblico. Efésios 4:11 menciona o ministério de evangelistas dentre vários outros, indicando que não são todos os crentes que devem exercê-lo (assim como não são todos apóstolos, pastores, profetas...). Há, portanto, um ministério e um dom específico que o Espírito concede a alguns. O conteúdo geral das epístolas concorda com isso. Não há nenhuma ordem à Igreja para que ela evangelize dessa forma. Paulo fala sobre si mesmo como missionário, dá orientações para Timóteo, assim como Jesus falou aos discípulos, mas nenhuma Igreja recebeu esse comando para que todos os crentes evangelizem como missionários – embora a maioria das pregações atuais seja exatamente isso, uma ordem para todos evangelizarem, o que contrasta fortemente com a prioridade das cartas. Existem algumas poucas orientações para uma postura respeitável e digna perante os de fora, mas não para uma proclamação específica sobre o evangelho. O segundo ponto de vista também é problemático, pois ele se baseia somente na frase atribuída a Francisco de Assis “Pregue o evangelho; se necessário, use palavras”. Não sei o contexto original dessa frase, mas o contexto em que ela é colocada hoje não é concordante com a Bíblia. É como se ela dissesse que o testemunho de vida fosse suficiente e que palavras frequentemente não são necessárias. Não é possível, porém, que um descrente seja evangelizado sem que você use palavras. Entendo que o testemunho de vida seja o principal, mas está incluso nesse testemunho as suas palavras, pois o que você diz reflete aquilo que importa em seus conceitos, aquilo em que você crê. Se você ama Jesus, ele estará em suas falas comuns.
           
Portanto, quero, em primeiro lugar, fazer distinção entre o ministério de evangelismo, do qual não são todos os crentes que devem fazer parte, e o testemunho pessoal. Os ortodoxos gregos entendem corretamente que evangelismo, como missão, é algo que deve ser feito em sociedades que não conhecem ou que rejeitam o cristianismo. Em países como o Brasil ou os Estados Unidos, não faz sentido você evangelizar do nada, como se dissesse “Você conhece Jesus?”. A religião cristã é algo presente na cultura, não é estranho para ninguém. Claro que há muita bobagem religiosa misturada. Mas a mensagem do evangelho é acessível a todos os que quiserem, basta que procurem uma Igreja que proclama o evangelho, que leiam a Bíblia, até a internet está cheia de artigos cristãos e uma Bíblia online. Não significa que a Igreja deve ser inerte. O que ela deve fazer é de fato ser coerente com aquilo que ela tem como propósito, que é manifestar o ser de Cristo para o mundo. Por essa razão, o principal para que a Igreja como um todo e todos os crentes individualmente façam é ser testemunhas de Jesus, expressando o seu caráter e a regeneração espiritual. O testemunho é o que atrai as pessoas confusas sobre o evangelho para fazerem perguntas. Provavelmente vai atrair também para fazerem piadas e críticas. Mas o crente, sendo coerente com os seus princípios cristãos, esclarecerá o evangelho ao dialogar com os descrentes.
           
Vamos ser ainda mais práticos. Afinal, é pra usar palavras ou não? É muito estranho pensar que palavras são dispensáveis. A própria existência e eficácia da palavra é um tema central na Bíblia como revelação de Deus. É a palavra de Deus que vem ao povo, é ela quem cria o mundo, é ela quem encarna em Jesus. Seria um grande erro descartar palavras, como se somente o bom comportamento bastasse. E como seria se o crente não usasse palavras? Quer dizer, ele mostra um comportamento moral, ele se limita a dizer “sou cristão”, e fica calado quando o seu círculo social começa a discutir religião, ou quando fala sobre conceitos mundanos, ou sobre práticas pecaminosas? Já que estamos falando de testemunho, vou falar um pouco do meu. Eu estou lentamente aprendendo isso tudo. Já sei que não tenho o dom de evangelismo. Não sou do tipo “Vou agora aproveitar esse momento de silêncio para falar de Jesus para essa pessoa”, e já compreendi que essa prática específica não é obrigatória, embora eu muito me culpasse antigamente por essa “omissão”. Tenho boa relação com meus colegas de trabalho, brinco com eles, rimos juntos, como pessoas normais. Mas o ponto fraco deles é quando vamos falar sobre casamento e traição. Quase todos os meus colegas já traíram suas esposas, e todos detestam o casamento. No momento em que surge o assunto, eu coloco minha posição cristã. Digo que não vou trair minha mulher porque a minha fidelidade é fundamentada na perfeita fidelidade de Deus a seu povo, e não em minha vontade esforçada. E digo que o casamento é maravilhoso e que o meu vai dar certo porque ele é um reflexo da aliança de Cristo com sua Igreja, não uma instituição humanamente resolvida. Bem simples, pura verdade, sem moralismo chato nem negligência. Como consequência, um dos colegas me perguntou sobre Igreja e Bíblia, e então eu expliquei o evangelho de forma mais sistemática. E ordenei que ele se arrependesse de sua vida de pecado e cresse em Jesus.
           
Percebe o ponto? O testemunho de vida não é forçado. Aliás, seria bem estranho se você é um crente e, quando se junta aos mundanos, pensa “opa, hora de dar bom testemunho”, como se seu testemunho pudesse ser removido quando você quisesse. Testemunho é questão de ser, de identidade. Você não simplesmente resolve dar bom testemunho ou não: ou você é testemunha de Cristo ou não. Se você é, falará sobre ele naturalmente. Envolve esforço, sim, mas o esforço se baseia na realidade de que você ama Jesus e tem consciência da suficiência dele para a sua aceitação e sua autoridade. Você sabe que não precisa ser aceito pelos súditos se é aceito pelo Rei. Não é um esforço para ser aceito por Deus, mas porque você já é aceito. Não é para aliviar a consciência, mas porque a sua consciência já foi tranquilizada por Jesus. Enfim, não pense que é necessário programar um tempo e uma ocasião para evangelizar, porque as oportunidades surgirão naturalmente, e você responderá a elas conforme uma testemunha de Jesus. Também não pense que é só mostrar comportamento moral e pronto, pois a vida centrada em Jesus afeta todo o nosso ser: pensamentos, emoções, axiomas, atos, hábitos e palavras.
           
Lembre-se também de que o bom testemunho deve ser diretamente dependente do evangelho como um todo. Isso significa que você deve expressar a repreensão ao pecado e a humildade de Jesus. Se você só aponta tudo o que há de errado em todo mundo, você não está se assemelhando a Jesus, e sim a um moralista chato típico. Se, por outro lado, você for só a pessoa legal e gentil (o extremo em que eu sempre vivi), o descrente nunca saberá que o pecado dele é coisa séria. Muita gente acha que, se você deixar claro que você é crente, mas ter uma amizade toda feliz e compreensiva com o descrente, ele vai ver a compaixão de Jesus em você e será atraído para o evangelho. Mas que evangelho é esse que não fala nada sobre o “arrependa-se”? O descrente não vai ver diferença nenhuma entre ele e você.
           
Opa, eu disse “diferença”? Vamos desfazer essa noção moderna de “fazer a diferença”. Fazer a diferença é mera consequência do bom testemunho. Não sei de onde as pessoas inventaram que não ficar, não beber e não ir à boate fazem alguma diferença. Quer dizer, se o descrente convida você pra ir à boate, e você diz “Não, não, obrigado”, você realmente espera que ele vá responder “Puxa vida, como você é diferente! Explique melhor a razão de você ser tão peculiar!”? Nãããão, ele apenas vai dizer “Ah, tudo bem, até mais”. Acredite, existem descrentes que não vão à boate! O que não existem é descrentes que creem em Jesus e se submetem ao seu reinado, isso sim será a diferença entre você e o seu colega ateu. Pare de inventar estereótipos e entenda o que a Bíblia diz sobre quem é descrente. A Bíblia não diz que o descrente é a pessoa que finge ser feliz na frente dos outros, mas sente uma solidão tremenda e depois cai em choro no seu quarto. Descrentes são sim sorridentes e pensam sim que são felizes e realizados. Existem descrentes que não ficam. Existem os que não bebem. Existem os que respeitam a religião. Nada dessas coisas é central no bom testemunho. O que a Bíblia diz é que o descrente é perverso, odeia a justiça de Deus e as suas leis e ama os seus próprios caminhos idólatras. Uma testemunha de Jesus será diferente nisso. Você não é boa testemunha por não ir às festas, por estar sempre alegre – o que é absurdo, porque o crente fica sim triste de vez em quando  - ou por sair dizendo “Deus te abençoe” e “Glória a Deus” bem alto pra todos os descrentes ouvirem.
           
A sua vida de bom testemunho deve ser sábia e deve fluir da sua fé no evangelho e no seu amor a Jesus. Examine-se a esse respeito. Veja se você está envergonhando o nome de Deus, mesmo pensando que o está honrando. Manifeste o caráter de Cristo, porque é ele quem vive em você, não por apenas cumprir norma.

            André Duarte

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