quinta-feira, 6 de junho de 2013

Pais: educadores cristãos


            É bem sabido, mesmo no mundo laico, que a família é a base da sociedade. Ela é o átomo do mundo social. Da mesma forma, a Igreja é descrita, especialmente pelas epístolas pastorais, como uma grande família. Os idosos são comparados a pais, as idosas como mães, as mulheres jovens como irmãs. Uma das qualificações necessárias para o presbítero-pastor-bispo é ser um pai eficiente, que governa bem o seu lar e não tenha filhos insubmissos e desobedientes. Paulo dá a razão óbvia: se alguém não pode governar a própria família, como guiará a família de Deus? O ponto é que a família é também a base da Igreja. E, embora o relacionamento de cada membro da família nuclear seja orientado pela Bíblia, quero falar especificamente sobre o dever dos pais aos filhos.
           
Todo mundo sabe que uma causa fundamental para o fracasso moral do mundo é a má educação dentro de casa. Os pais frequentemente negligenciam a educação séria de seus filhos e limitam-se a detalhes facilmente expressos em ordens curtas. Confiam na escola para a educação profunda, a qual cada vez mais preocupa-se em nada mais do que preparar para o ingresso em uma universidade por meio de uma prova. Se o filho passar no vestibular, então a missão paterna foi cumprida. E, se o filho for um fracasso em tudo o mais na sua vida, os pais não sabem onde erraram. Tal fracasso repercute na sociedade, cujos componentes são todos filhos de alguma família. Um monte de filhos desorientados, sejam ou não universitários, destrói a harmonia da sociedade.

            Tudo isso vale para o mundo laico. Mas, será que na Igreja é tão diferente? Pais cristãos têm uma noção melhor, pelo menos teórica, de sua responsabilidade como formadores de valores. O grande ponto é: será que os pais assimilaram o fundamento dos seus próprios valores que eles pretendem transmitir aos filhos? Ou apenas decoraram regras e repetirão regras aos filhos? Ok, uma coisa de cada vez. Primeiro, a generalidade de pais cristãos têm como preocupação principal o mesmo dos pais laicos: vida acadêmica. Mas existem certos acréscimos à vida acadêmica, que é justamente o que os pais crentes pensam que é o diferencial de uma educação cristã: outras regras supérfluas. Pais cristãos, além de serem rígidos com escola, costumam também ser rígidos com regras sobre a hora de dormir, a hora de chegar em casa, a hora e o lugar das refeições, a arrumação do quarto, a frequência nos cultos. Pais de meninas, principalmente, são neuróticos com os namoros delas. Mil regras, observações, ressalvas, tudo em nome da pureza.

            Espere aí. É necessário sim ter regras. Os pais devem conduzir os filhos por meio de regras. Quando os filhos são crianças, principalmente, a existência de regras é importante para a formação do caráter. Mas isso basta? Ora, simplesmente repetir regras e ordens é muito fácil. Não exige tempo, paciência, dedicação... é apenas um negócio a mais para ser administrado. Muitas vezes, os pais também seguem regras próprias sem nem saber por quê. Consequentemente, não têm o zelo de explicar o porquê aos filhos. É difícil encontrar pais cristãos que sejam abertos a conversar com os filhos sobre as regras que eles fazem. Poucos filhos conseguem questionar seus pais sem serem repreendidos ou ouvirem uma resposta evasiva. As regras funcionam somente enquanto a coação está presente. Quando os filhos saem de casa, ou mesmo quando ganham certa independência, as regras sem fundamento serão esquecidas. Os pais devem se preocupar em educar os filhos para que eles sejam verdadeiros cristãos mesmo na idade adulta, quando tiverem possibilidades e recursos para fazer o que quiserem. As regras não esgotam sua finalidade em si mesmas. Talvez haja uma motivação legalista em certos pais, que querem ser aceitos por Deus pela boa obra de criar um filho corretamente. Esses pais, no fundo, não se importam se os filhos realmente permanecerão em Deus para sempre; importam-se consigo mesmos, em garantir que, se o filho se desviar um dia, não foi culpa deles.

            Não acho que seja necessário citar os versículos que falam sobre como os pais devem educar os filhos, como se fossem novidade. Todo mundo sabe que Efésios 6 diz que os pais devem criar os filhos no caminho do Senhor, e não ser irritáveis, tratando os filhos como se fossem meras extensões de sua autoridade. Também em Deuteronômio está escrito que os pais devem falar das palavras de Deus com seus filhos a todo momento, no caminhar, no levantar e no deitar. Agora, todos os pais cristãos acham que estão cumprindo isso. Será mesmo? Em primeiro lugar, será que os pais realmente decidem ter filhos já sabendo o que eles terão de fazer? Será que amadurecem primeiro para então criar filhos? Ora, para um adulto se casar com uma adulta, ambos devem ter profundo conhecimento do que as Escrituras exigem de um casamento. Devem saber o que é o pacto de Deus com o seu povo, o casamento de Cristo com a Igreja. Só então, entenderão como deve ser um casamento comum. O mesmo tipo de reflexão deve haver antes mesmo da decisão de ter filhos. Será que os pais realmente agem como o Pai celestial age com seus filhos? Às vezes, a única semelhança que encontramos é a que não deveria existir – os pais praticamente exigirem ser adorados pelos filhos. Ou então insistindo com os filhos que eles sabem de tudo, que são os grandes sábios da vida.

            Pais cristãos devem saber que estabelecer 3 ou 4 regras – assista os cultos, não fale palavrão, não faça sexo, não bata no seu irmão, vá lavar a louça, etc – é muito longe de fazer educação cristã. Como eu disse antes, dar broncas e proclamar regras não dá trabalho nenhum. O que dá trabalho é passar tempo com o filho, conhecendo-o, ouvindo-o, abrindo-se com ele quanto aos seus próprios defeitos (tolos pais, realmente acham que podem manter uma imagem de invencíveis). Jesus não faz dos filhos de Deus apenas servos, mas amigos. E ele diz que a marca dessa amizade é a revelação transparente e clara que vem de um relacionamento íntimo. Deus, nosso Pai, revelou plenamente de si mesmo aos seus filhos, e conhece perfeitamente os filhos que ele criou. Da mesma forma, os pais devem deixar que seus filhos os conheçam. Não passivamente, como muitos fazem, esperando o filho ter vontade de conhecê-lo. Mas, como Deus não ficou esperando os humanos descobrirem o evangelho sozinhos, os pais precisam falar para os filhos quem eles são. Abrir o coração. Confessar suas angústias, suas expectativas, contar sua história.

            E a parte de ensinar as regras, como fica? Acontece que Deus revelou aos seus filhos não apenas a sua Lei, mas o seu espírito, sua aplicação, seu propósito, sua finalidade, sua motivação. Pais devem ensinar aos filhos por que eles estão ordenando que ele vá arrumar o quarto. Por que é importante que ele estude. Certos pais relapsos levam isso a um lado péssimo, exigindo que o filho lhe obedeça somente quando conseguir convencê-lo. Não é isso. Pais devem sim exercer autoridade e disciplina com rigidez. Mas eles devem retirar das leis de Deus e do seu evangelho as regras próprias para o lar. Nenhum pai deve pensar que pode inventar um sistema moral e sábio melhor do que o de Deus. Pais legalistas deleitam-se na arbitrariedade com que comandam os filhos, sentindo-se deuses. E, quanto ao ensino dos caminhos de Deus, igualmente os pais devem saber explicar, fundamentar, provar pela Escritura e inclusive permitir ser questionados. Por que ir à Igreja todo domingo? Por que orar antes de dormir? Por que ler a Bíblia todo dia? Por que não mentir? Os pais precisam esclarecer isso. Eles devem saber qual é a finalidade das leis de Deus, que é também revelada na Bíblia. Se não compreenderem profundamente os propósitos e motivos das leis de Deus, também não saberão ensinar.
           
Desnecessário é lembrar que o ensino mais eficaz é o exemplo. Pais nunca vão convencer os filhos de que falar palavrão é errado se eles mesmos falam quando estão no trânsito ou assistindo futebol. Não vão ensinar o filho a ser paciente se eles estão sempre angustiados. Não vão ensinar a mansidão se gritam com raiva por qualquer motivo. Não vão ensinar a justiça se eles são injustos. Não serão bons educadores se não educarem a si mesmos. Além de educadores inúteis, são também hipócritas que não fazem mais do que incomodar os ouvidos de Deus. E serão cobrados. Pois o chamado para ser mestre em casa – que é do pai e da mãe igualmente – é seríssimo, a missão mais importante da vida de quem tem filhos.
           
Como os pais seculares confiam a educação moral à escola, também os pais cristãos confiam à Igreja. Erro total. A constância dos filhos como alunos está no lar, não na Igreja. É no lar que eles realmente vivem. Igreja, no início, é percebida apenas como uma rotina. E a Igreja não ensinará todos os filhos membros com total eficiência; além de ser impraticável, nem é papel principal dela. Pais devem dedicar o máximo do seu tempo com os filhos. Ensinar a Bíblia todos os dias, não só quando não estão cansados do trabalho. Falar sobre as Escrituras com naturalidade, não com um clima de medo e tensão. Se os pais não cumprem seu dever correto com os filhos, se acham que estabelecer certas regras é o suficiente, o resultado é a Igreja tornando-se desviada, desorientada e oscilante entre legalismo e antinomismo. O sucesso e o fracasso começam em casa. Relações familiares são um espelho da relação pactual de Deus com o seu povo. Não há manual de instruções nem convenções culturais particulares da família que possam substituir isso.


            André Duarte

Nenhum comentário:

Postar um comentário