domingo, 14 de julho de 2013

Disney e evangelho


           Embora já tenha havido posts a respeito de filmes específicos, quero aqui retratar paralelos entre toda a cultura Disney e a mensagem do evangelho. É inegável que a Disney influenciou grandemente a cultura ocidental e imprimiu seus conceitos no imaginário coletivo. Quem pode olhar uma maçã vermelha e suculenta e não pensar se ela está envenenada? Quem não sente que, se você acreditar, pode realizar os seus sonhos? Quem se apaixona que não pensa em viver feliz para sempre com o par encantado? Especialmente para quem vai aos parques Disney, existem mensagens muito claras e insistentes que formam a base das produções dessa empresa, e que procuram converter os convidados (assim são chamados os clientes) às doutrinas dela. Vamos tratar, então, de conceitos fundamentais e primários da Disney e ver a obra de Deus, o Salvador, através delas.
           
The Damsel in distress. Talvez o que haja de mais atômico nas produções Disney seja a princesa que corre perigo. É interessante observar, inclusive, como que, através das décadas, essas princesas têm se tornado cada vez mais autônomas e ousadas. Branca de Neve, Cinderela, Aurora, que são princesas antigas, são realmente completamente indefesas até que um príncipe as salve. Jasmine, Ariel, Nala e Bela já demonstram um espírito mais rebelde contra a cultura e tomam parte ativa no desfecho vitorioso do enredo. Mulan... é asiática, então não conta :P. Ela é a heroína completa da história, mas lembre-se de que ela faz isso assumindo o papel literal de homem; não faz isso como mulher. Rapunzel, uma das princesas mais recentes, faz tudo na história, com independência, determinação. Mesmo assim, todas as princesas Disney acabam precisando do herói masculino, o príncipe, mesmo que seja nos últimos minutos. Giselle, embora salve o Robert no final, demonstra ser sempre a moça que almeja ser conquistada pelo seu príncipe (inclusive, no fim, pelo próprio Robert). O estado de necessidade, de incompletude em si mesma, de anseio pelo amor pactual – pois a Disney sempre trabalha o amor no contexto de casamentos – é verdade a respeito do povo de Deus, a Igreja. Nós, a Igreja, fomos criados para não termos sentido à parte do noivo, Jesus Cristo. Somos sim vítimas dos perigos de Satanás, do pecado e da morte, e completamente indefesos contra eles. Precisamos de um Salvador real. Note também que as princesas são sempre virgens e puras. Da mesma forma, a Igreja que se encontrará com o seu Salvador é pura, sem mácula ou ruga alguma (Efésios 5, Apocalipse 14:4, etc). A pureza é essencial para a Igreja se casar com o seu príncipe. Porém, a pureza dela vem de fora, e esse é o próximo ponto.

The Prince Charming. Para fazer par com as princesas da Disney, nada mais adequado do que os príncipes encantados. O príncipe é batalhador, e é ele quem dá o último ato na redenção final da mulher. Eric matou a Úrsula, Aladdin prendeu o Jafar, Simba derrotou Scar, Felipe matou Malévola. O príncipe da Disney é valente, heroico e frequentemente arrisca a sua vida para salvar a princesa. É de um Salvador como esse que nós precisamos. Jesus Cristo, nosso Príncipe Encantado perfeito, é corajoso e amoroso o suficiente para não apenas arriscar a sua vida, mas entregá-la em total voluntariedade e consciência para nos salvar do vilão. Ezequiel 16 demonstra como Deus é o príncipe encantado que se casa com o seu povo, este personificado como uma mulher que ele tornou pura. Temos, aqui, uma diferença importantíssima a salientar: na Disney, o homem e a mulher são puros. Às vezes, o homem não é puro exteriormente, mas é puro de coração (Aladdin e José Bezerra são ladrões, mas “bonzinhos”), enquanto a mulher é sempre pura. No evangelho, temos o inverso: Jesus Cristo é o máximo da pureza e da perfeição, e a Igreja... é, na verdade, uma prostituta! Nós nos prostituímos com deuses que inventamos, somos adúlteros contra o nosso príncipe. Mas Jesus Cristo efetua em nós, pela limpeza do seu sangue derramado, a purificação espiritual. É ele quem cuida de nós e nos prepara para sermos imaculados quando nos encontrarmos com ele no céu. Ele é o nosso Príncipe. Não é o garoto por quem você escolheu esperar! Tampouco, homem, é você o redentor da sua namorada. É o Filho de Deus, que virá para vencer o mal em seu cavalo branco, portando uma espada em sua boca, o belíssimo noivo de sua Igreja.

True love’s kiss. “It’s the most powerful thing in the world”, Giselle disse. Também, para a alegria das famílias de boa tradição, a Disney sempre retrata o primeiro beijo no contexto de um casamento ou, pelo menos, de um princípio de noivado. O beijo nunca é banalizado na Disney. Ele é o sinal garantido de que haverá um casamento, se não ocorre somente no casamento. Ele é algo definitivo, que transforma a relação entre o príncipe e a princesa, é um divisor de águas. Frequentemente, ele desperta princesas adormecidas, como a Branca de Neve e a Aurora. Da mesma forma, a cruz de Cristo e sua ressurreição são o nosso “beijo de amor verdadeiro”. Estando nós adormecidos eternamente pelo poder do mal, pelo veneno e pelo feitiço do pecado, é necessário que o nosso príncipe faça algo para nos ressuscitar. O que Jesus Cristo fez foi dar a sua vida e tomá-la de volta. Pelo sacrifício do nosso príncipe, somos despertados para, somente então, sermos cativados por seu amor e aptos para nos casarmos com ele. Repetindo, o beijo é a garantia de que haverá casamento. Nosso casamento com Jesus Cristo, no céu, como Apocalipse 19 nos diz, é garantido pelo beijo que ele nos deu na cruz. Por termos sido resgatados e cativados pelo seu beijo, recebemos a promessa de nos tornarmos sua esposa, reinando com ele para sempre. Então, sim, é verdade que a obra do nosso Senhor na cruz “is the most powerful thing in the world”.

The Fairy Godmother. Muitos contos Disney mostram fadas que, pelo seu poder sobrenatural, capacitam a princesa para atingir o seu objetivo de conquistar o príncipe. Vamos fazer aqui outra distinção: geralmente, na Disney, é a princesa que quer muito encontrar o seu príncipe, e cabe a ele reagir para isso. Embora eu tenha dito que o povo de Deus anseia por um resgatador, esse resgatador é sempre uma distorção do verdadeiro. Nós nunca realmente desejamos Deus enquanto estamos mortos em nossos pecados. É dele o plano, a iniciativa, o princípio e o fim da nossa salvação. Apesar dessa diferença, ainda assim a fada tem um paralelo interessante com o Espírito Santo enquanto regenerador. Veja: foi a Fada Azul quem capacitou Pinóquio a tornar-se vivo e atuante – como o Espírito de Cristo nos reaviva para iniciarmos nossa jornada com ele. Foi a Fada Madrinha quem deu à Cinderela vestes de princesa e uma carruagem, assim como o Espírito Santo nos santifica e nos conduz ao noivo. Foi a Sininho quem lançou o pó mágico para as crianças voarem, da mesma forma que o Espírito de Deus nos ressuscitará e nos levará às alturas, onde o santo noivo habita. Apenas um poder sobrenatural das fadas permite que o enredo termine em casamento. Apenas pelo poder sobrenatural do Espírito, somos regenerados e conduzidos em espírito e em corpo até o nosso Príncipe.

The poisoned apple. Embora seja uma particularidade de um único filme, Branca de Neve e os Sete Anões, é um dos mais fortes ícones da ideia Disney. A maçã envenenada é oferecida pela rainha bruxa, disfarçada de mendiga, para que Branca de Neve “morra”. O que Satanás fez à primeira mulher? Em roupagem diversa, de serpente, oferece enganosamente o fruto proibido pela mesma intenção. Embora não saibamos qual era o fruto proibido, é interessante observamos que ele costuma ser pensado como uma maçã, que é justamente o fruto da Branca de Neve. O que a rainha diz para enganar a princesa? “É só prová-la e todos os seus sonhos se realizarão”. O que Satanás diz? “É só provar, e você será como Deus”. Em engano e desobediência, Eva comeu do fruto, como a princesa Disney (pois os anões também haviam ordenado que Branca de Neve não falasse com ninguém que viesse à casa). O fruto era envenenado, e a princesa adormece. Porém, não é possível que esse fruto seja perpetuamente letal. Há um antídoto, e disso nós já falamos. Como o beijo do príncipe reaviva a princesa envenenada, a obra do nosso Príncipe anula a mortandade do pecado.
           
Dreams come true. Acho que essa é a frase mais repetida no Magic Kingdom. A música tema das paradas tem isto como refrão “Celebrate the dream inside of you, dream that just came true”. O show Dream Along With Mickey ensina que, se repetirmos bem alto e com muita fé que “Dreams Come True”, o mal é derrotado (no caso, a Malévola foge). E o fim da última música diz “Find your dream inside of you”. O segundo longa-metragem da Disney, Pinóquio (1940), tem como música vencedora do Óscar “When you wish upon a star”, a qual diz, no final, que... your dream comes true. A grande celebração para Cinderela é que “o seu sonho de felicidade se realizou”. Gaston, ao cantar a Bela, diz “hoje é o dia de realizar o seu sonho”. Esse termo está em toda parte! Infelizmente, penso eu que esse é também o termo mais desviado do evangelho. Ele ensina, em todo o contexto Disney, que a realização desse sonho depende de você. “É só você pedir e a estrela transformar”. De acordo com o Magic Kingdom, todos os seus sonhos podem se realizar se você acreditar “muito”. Esse tipo de pensamento acaba por negar a soberania de Deus e nos proclamar como deuses de nossa vida. Tiago diz que a vanglória sobre o dia de amanhã é demoníaca. E o “engraçado” é que boa parte da cristandade vê Deus exatamente assim, como o gênio da lâmpada do Aladdin, que realiza tudo o que nós pedimos, desde que tenhamos “muita fé”. Agora, vamos redimir o termo “dreams come true”. Não acho correto, como certos crentes dizem, que “você tem de sonhar os sonhos de Deus”, porque o Deus onisciente e soberano não sonha, ele simplesmente determina e faz. O antropomorfismo é exagerado. Porém, entendendo que o sonho da princesa é encontrar o seu príncipe, entendendo que isso só é possível quando uma fada a ajuda, e que depende do príncipe lutar e vencer a realização desse sonho... aí a coisa muda de figura. A fada da Cinderela veio porque ela teve fé. A realidade, porém, é que o Espírito vem e então ele nos concede fé. Fé não é obra humana, mas é dádiva de Deus. E a fé verdadeira é aquela que tem um alvo verdadeiro, que é Jesus Cristo. Tendo isso em mente, sabendo que o maior sonho nosso, como noiva, é encontrar o Príncipe da Paz, então aí sim podemos declarar que Dreams Come True. Pois, como Paulo diz em Romanos 5, “a esperança não nos decepciona”.
           
Happily Ever After. Todo filme Disney termina com o casamento. Toda história de príncipe e princesa encerra com o fim de todo o enredo, a aliança, realizado. As histórias Disney visam ao casamento. Essa fixação pelo pacto é algo bíblico – naturalmente, o pacto correto. Podemos ter a certeza de que o fim de toda a história do mundo, aquilo de que trata a escatologia, o resultado inexorável de todas as coisas, é o casamento entre Jesus e a Igreja. Um casamento onde verdadeiramente existe um felizes para sempre. Na plena comunhão com o Salvador, gozaremos de felicidade eterna, pois “Deus enxugará toda lágrima de seus olhos”. É para esse fim que o beijo do amor verdadeiro – sim, o beijo daquele que é Amor e é Verdadeiro – é dado na cruz. Como a fada é empática com a princesa, o Espírito e a noiva dizem “Vem, Senhor Jesus”. Não há feliz para sempre senão com o único Príncipe Encantado, o Filho de Deus, Jesus Cristo. O encerramento de toda história Disney é como o encerramento da Bíblia: “E viveram felizes para sempre”.

(E tem gente ignorante o suficiente pra dizer que Disney é do demônio...)


André Duarte.

3 comentários:

  1. Interessante seu post, gostei bastante. Vale à pena pensar em algumas coisas no sentido que escreveu e em outros. Mas veja que os personagens da Disney que citou, em sua maioria, já existiam nos contos de fada anteriores à Disney. Esses personagens formados desde a cultura popular, adaptados na tradição oral e depois aperfeiçoados em escrita para uma sociedade ocidental mais moderna, tem em seu cerne muitos valores dessa sociedade judaico-cristã. Então talvez, ao invés de converter nesse sentido, a Dsiney esteja reforçando tais valores, do meu ponto de vita muito patriarcais e androcêntricos, e fazendo uso de um imaginário existente, vendendo assim o que as pessoas querem mesmo ver. Claro que nunca é de uma via, afinal as coisas nesse mundo são muito dialéticas, concordo que eles tbm constroem imaginário. Só pra continuar na temática, recomendo a leitura desse texto aqui. http://www.prazerdapalavra.com.br/recursos/lingua-portuguesa/3052-branca-de-neve-e-os-7-anoes-teologia-prof-adalberto-alves-de-souza.html

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  2. Legal, Carol, bom pensamento. É outra perspectiva legal de ver a história. Agora, eu percebo muito mais as diferenças dos contos originais das adaptações da Disney. Os originais eram bem mais sanguinolentos e cruéis, e acho difícil que os valores deles tenham sido reforçados pela Disney. A Disney é extremamente original quando se trata de suas ideologias. Ah, gostei muito desse link, parece que alguém havia pensando umas coisas antes de mim, hehe.

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