domingo, 14 de outubro de 2012
Pai Nosso
O Senhor Jesus, em seu chamado “sermão do monte” (e, segundo o evangelho de Lucas, em outra ocasião a sós com os discípulos), deu-nos um maravilhoso ensino sobre a oração. Em primeiro lugar, ele diz o que oração não é: barulho para chamar atenção, alerta a Deus sobre os problemas que ele está esquecendo, solução para se conseguir o que quer através da repetição. “Eles pensam que, por muito falarem, serão ouvidos”. Oh, não consigo imaginar nenhum paralelo atual com essa prática farisaica ignorante, lalala...
Ele então nos dá a ordem: “Vocês, porém, orem assim”. Embora a oração possa variar em muito o conteúdo dependendo das circunstâncias, existem os seguintes elementos essenciais que devem estar presentes, pelo menos regularmente. Ei-los:
Pai. Jesus nos revelou o Pai, como ele diz em outro lugar: “Ninguém conhece o Pai, a não ser o Filho e aqueles a quem o Filho quiser revelar”. A consciência de que Deus é Pai traz para o nosso coração a realidade de que ele é o provedor de todas as nossas necessidades, como o Senhor disse no mesmo discurso “o Pai sabe do que vocês precisam mesmo antes de pedirem”. Além disso, a verdade de Deus como o Pai coloca-o como o disciplinador de seus filhos. O escritor da carta aos hebreus diz “se vocês se submetiam à disciplina dos seus pais terrenos, muito mais devem se sujeitar ao Pai celestial” e cita o provérbio que diz “Não se magoem com a disciplina do Senhor, pois ele corrige a quem ele ama”. O Pai também traz a realidade da segurança e estabilidade carinhosa familiar. Ele é o Pai de Jesus Cristo, seu único Filho gerado, de quem nós, filhos por adoção, somos irmãos e herdeiros dos tesouros celestiais garantidos pelo Pai.
Nosso. O Pai não é só meu, ele é nosso. Se ele é o Pai de Jesus, e se a Igreja é o corpo de Jesus, é natural que ele seja o Pai não só do indivíduo, mas de toda a Igreja como uma só. Jesus nos ordena que oremos em comunidade. A oração mútua é edificante para a Igreja e uma magnífica disciplina contra o egoísmo e o individualismo. Tiago nos diz para confessarmos nossos pecados uns aos outros e esse remédio obviamente inclui a oração em conjunto. As epístolas são repletas de encorajamentos para que a Igreja esteja sempre agradecendo a Deus, com os membros dela dizendo palavras de “ações de graça” entre si. Ninguém pode achar que tem uma relação individual com Deus na qual ninguém tem nada a ver. Quem ora a Deus precisa reconhecer que ele é Pai do Cristo eclesiástico, o que inclui todos os santos.
Que estás no céu. Essa é uma doxologia sintética que reconhece Deus como o Altíssimo. Se o Pai está no céu, ele tem todo o poder e conhecimento, e essa realidade traz a nós confiança e paz quando oramos. Deus não está escondido e nem está limitado, mas preenche todas as coisas com a sua glória e o seu reino. Essa declaração não distancia Deus de nós, mas faz lembrar a belíssima revelação de Isaías: “Habito num lugar alto, mas também habito com o humilde, contrito e de coração quebrantado”.
Santificado seja o teu nome. As partes anteriores identificam o destinatário da oração. Esta cláusula é o início da petição e ela nos direciona para a questão mais importante: qual o propósito da minha oração? A oração expressa o meu desejo ou o desejo de Deus? Todo mundo é rápido para lembrar do que João diz, que Deus atende as orações que correspondem à sua vontade, mas muitos se perguntam “qual é a vontade de Deus para que eu possa orar por ela?”. É pouco o que Jesus está revelando? Nós devemos pedir e desejar que o nome de Deus seja reconhecido e adorado como santo em toda a terra. A vontade de Deus é que todo o mundo o adore, e é por isso que devemos ansiar quando oramos. Santificar o nome do Senhor começa, obviamente, com a nossa própria vida e com a forma com a qual oramos. Um coração que anseia pela santificação do nome de Deus está verdadeiramente adorando o Pai.
Venha a nós o teu reino. Oh, que assunto extenso para comentar em poucas linhas! O reino de Deus é uma realidade espiritual entre nós, como Jesus disse mais tarde: “O reino de Deus não é localizado, como se alguém pudesse dizer ‘está ali’, mas ele está entre vocês”. O reino de Deus consiste, segundo Paulo, de “paz, justiça e alegria”. E, de um ponto de vista metalinguístico natural, o reino de Deus é a esfera em que ele é reconhecido por seus súditos como o rei de suas vidas. Isso significa submissão e temor, mas o desejo de que o reino de Deus venha expressa um amor fervoroso pela intervenção de Deus no mundo – ou, como diz Paulo, “Paz seja com os que amam a sua vinda”. O reino de Deus já existe entre nós e ele deve ser intensamente buscado para que nós cresçamos na maturidade de súditos, mas ele é também uma expectativa apocalíptica. Se Deus reina, ele governa a vida de seus súditos e esmaga os rebeldes. É justo e santo pedir que Deus traga punição sobre aqueles que odeiam o seu reino: quem sabe assim eles se arrependem. Mas o reino apocalíptico restaurará todas as coisas e finalizará a rebelião humana. O desejo por esse paraíso deve estar presente quando oramos.
Seja feita a tua vontade, assim na terra como nos céus. Nossa petição deve trazer invariavelmente a submissão à vontade de Deus, que pode rejeitá-la ou acatá-la. Jesus, em sua grande angústia no jardim, orou para que Deus o livrasse da dor de suportar a sua ira, mas acrescentou “que seja feita a sua vontade, e não a minha”. Absolutamente ninguém tem o direito de determinar a ação de Deus, nem de, como é comum atualmente, “profetizar” um evento. Clamamos a Deus para que ele nos atenda, mas confiando que, no mínimo, ele é mais sábio do que nós. Jesus disse que “quando o filho pede pão, o Pai não dá pedra”, mas quem somos nós para determinar que a nossa petição é pão, e não pedra? Nos céus, onde Deus habita, a sua vontade é exercida sem contestação: ele é constantemente adorado por seus anjos, e até mesmo o diabo não deixa de se submeter às ordens dele. Nós, humanos, devemos nos esvaziar quando oramos e quando vivemos e deixarmo-nos ser enchidos pelo espírito de submissão, confiança, adoração e humildade. Devemos expressar o nosso desejo de seguir a vontade de Deus tal qual os seus anjos no céu o fazem.
Dá-nos hoje o pão nosso de cada dia. Começa aqui a oração por nós mesmos. Orar pelo sustento básico diário condiz com a vontade de Deus e ele atenderá. Jesus nos disse que não devemos ficar desesperados por comida e roupas, pois o Pai cuida para que sejamos supridos nessas necessidades básicas. Paulo também diz “Não andem ansiosos por coisa alguma, mas lancem sobre ele suas ansiedades. Tendo o que comer e com o que se vestir, estejam satisfeitos”. É importante reconhecer que, quando oramos pelos propósitos de Deus, devemos fazer isso com paixão e força, mas, quando oramos por nós mesmos, devemos trocar a paixão por humildade. Jesus quer que nos lembremos constantemente em nossas orações que dependemos do Pai para as necessidades mais básicas devido à nossa condição frágil. E que o pão cotidiano nos ensine sobre o Pão vivo que desceu do céu.
Perdoa nossas ofensas, assim como perdoamos os nossos ofensores. Continuando no espírito de humildade, é necessário reconhecer que o pecado é parte de nossas vidas. Não é necessário tomar consciência de um pecado explícito para pedirmos perdão: veja o salmo 19, em que o compositor diz “Quem pode conhecer seus próprios pecados? Absolve-me dos que desconheço!”. Somos indignos e necessitamos constantemente do perdão gracioso de Deus para nós. No entanto, pedir o perdão de Deus a nós deve supor que nós também estamos perdoando aqueles que pecam contra nós. Do contrário, nem adianta pedir perdão. Jesus adverte várias vezes: “Se não perdoarem os pecados do seu próximo, Deus também não perdoará os seus”. Provavelmente, o pecado de não perdoar é aquele pelo qual nós mais necessitamos pedir perdão. Apenas o poder do evangelho, no qual o santíssimo e onipotente Deus perdoa as ofensas de humanos perversos como nós, pode nos capacitar a perdoar o próximo. É necessário pedir a Deus que nos ajude com a sua verdade a perdoarmos nossos ofensores. Que bom que, segundo o salmo 103, Deus não nos retribui conforme nossos pecados merecem, mas sua misericórdia alcança as nuvens.
E não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal. O fato de que precisamos orar constantemente por perdão não significa que o pecado cotidiano pode ser mantido devido ao seu remédio diário na oração. Pecamos sim, mas um verdadeiro cristão repudia o pecado. Ele clama a Deus que não o coloque no perigo de pecar – literalmente, o que está escrito é “não nos induzas à tentação” – mas, se Deus quiser prová-lo, que o livre de cair nessa tentação. O maior anseio que devemos ter por nós mesmos é que sejamos santos como o Pai é santo. Todo o resto é efêmero. Humildemente, o crente deve, em sua oração, reconhecer que depende do Pai para que possa resistir ao pecado. Atendendo a essa oração de forma generalizada, o Pai enviou o Paráclito, o Espírito Santo, que nos ajuda a derrotar a carne. Mas, devido à nossa fraqueza, devemos nos lembrar de nossa necessidade constantemente em oração.
Porque teu é o reino, o poder e a glória para sempre. Amém. Esse final doxológico (com exceção do “amém”) não aparece nos melhores manuscritos, mas é evidente que a oração deve necessariamente conter adoração e reconhecimento do verdadeiro Deus, poderoso para nos atender e também para não nos atender.
Que maravilhosa revelação sobre a oração o Senhor nos deu! É impossível estudarmos sobre oração sem considerar o que o próprio Jesus nos explicou. E que tristeza em contemplar a grande deturpação que se faz nas orações. O que vemos por aí? Pessoas orando sem nem conhecer quem é o Pai que nos atende; orando em individualismo, fechadas em seu mundinho particular; preocupadas com o sucesso do próprio nome, e não com o de Deus; torcendo para que o reino de Deus demore bastante a vir para que os prazeres mundanos continuem; pressupondo que a vontade de Deus automaticamente corresponde à delas; clamando pelo banquete esplêndido de cada dia; mal se lembrando do seu pecado e falta de santidade, mas pressupondo uma satisfação automática de Deus com as obras delas; sem vontade nenhuma de perdoar os seus inimigos; tratando o pecado como se fosse normal e corriqueiro, sem desejo de extirpá-lo. Sem adoração.
Esses são os nossos erros. Confesso que me identifiquei com alguns deles, especialmente minhas raras confissões de pecados e quase nenhum clamor por capacidade para eu mesmo perdoar os outros. Que o Senhor nos ajude.
Ps: Vamos experimentar fazer orações em todos esses sentidos nos grupos de vida? :D
André Duarte
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