terça-feira, 23 de outubro de 2012

Salmos 1



            Assim como fiz com o hino cristológico de Colossenses, coloco aqui na íntegra um pedaço do meu comentário sobre os salmos (o qual vai demorar um tempão pra ficar pronto, mas tudo bem):

“O primeiro salmo, colocado aqui como uma introdução ao saltério, descreve sucintamente o contraste entre o justo e o ímpio. Esse contraste é constante nos salmos, nos provérbios e em escritos poéticos dos profetas. Não há meio termo; toda a humanidade se encaixa na categoria de justo ou de ímpio. No Antigo Testamento, ainda não era conhecida claramente a revelação de justificação pela fé; no entanto, os salmistas inspirados por Deus conheciam pelo Espírito a graça de Deus e o conceito de fé ou confiança no Senhor como o fundamento da retidão. Mas, como o grande profeta Jesus ainda não havia proclamado o evangelho, os salmistas enfatizam os resultados e as características de um justo ou de um ímpio, sem explicar muito a base da fé em Deus. Posto isso, não precisamos ter a impressão de que os salmistas acreditavam em justificação por obras.

            O salmista chama o homem descrito nas linhas seguintes de bem-aventurado. É uma expressão abrangente que inclui felicidade interna, garantia do favor de Deus e sucesso naquilo que empreende. Esse é o constante elogio bíblico à pessoa que faz a vontade de Deus. O homem é bem-aventurado porque Deus graciosamente melhora as circunstâncias para o bem dele à medida que melhora o coração dele para aceitar as circunstâncias nas quais o ímpio não teria satisfação.

            Que características omitivas estão no bem-aventurado? Ele não anda no conselho dos ímpios, isto é, não rege sua vida segundo as opiniões dos maus, consciente de que a sabedoria mundana é contrária à de Deus. O conselho dos ímpios é voltado à ganância, ao egocentrismo e é afastado das leis de Deus; por isso, o bem-aventurado não os ouve. Além disso, ele não para no caminho dos pecadores. O caminho dos pecadores é descrito diversas vezes como cheio de espinhos e com seu fim na ruína e na morte. E é um caminho aparentemente largo e fácil, como o Senhor disse. O bem-aventurado não cruza esse caminho e nem mesmo fica inerte nele, esperando que o pecador andarilho o encontre ou esforçando-se para ter coragem de seguir nele. Dito de outra forma, o bem-aventurado nem flerta com a possibilidade de pecar. Também ele não se assenta na roda dos zombadores. A poesia descreve as ações do bem-aventurado na progressão andar-parar-sentar. Após ser seduzido pelo conselho do ímpio e escolher permanecer no caminho do pecador, o último resultado da rebelião é se assentar para confraternizar com outros que fizeram a mesma escolha. O bem-aventurado não cai no assentar-se, mesmo porque ele já evitou o parar e o andar. Os ímpios, escravos do pecado, constantemente se juntam para rir e zombar daquilo que Deus preza; zombam de suas leis, de seus fiéis e alegram-se com a desgraça dos inocentes. Longe disso está o bem-aventurado, pois o destino dos praticantes dessas coisas é a total desgraça.

            E quais são as características comitivas do bem-aventurado? Ele tem prazer em meditar na lei do Senhor. A satisfação e a alegria do justo é se maravilhar com a profundidade da sabedoria e do poder de Deus. Ele lê as Escrituras, medita em suas verdades e as pratica, e essa é a sua vida rotineira. Ele ama obedecer a Deus e ler e estudar repetidamente a vontade de Deus revelada (visto que os judeus não meditam apenas pensando, mas lendo várias vezes em voz alta). Mas é importante notar que é impossível para alguém ter prazer na lei de Deus se não tiver sido convertido ao evangelho da graça. Pois a lei está o tempo todo condenando o leitor. Só tem prazer na lei do Senhor quem encontrar a paz na sua graça e receber a alegria de ter seus pecados perdoados. Quem acredita em justificação por obras não sente alegria em obedecer a Deus, mas apenas uma obrigação pesada e mecânica.

            Qual é a recompensa desse justo? Assim como árvore plantada junto ao ribeiro, ele tem um fundamento firme. Ele é constantemente suprido pela provisão graciosa de Deus para o seu amadurecimento. E nessa provisão ele confia, de forma que não se abala quando chega o dia mau. Como diria Jesus, ele construiu sua casa sobre a rocha. O justo pode tropeçar, mas o Senhor o levanta. Assim, o justo está seguro e bem cuidado pelo Altíssimo. Sua nutrição pelo ribeiro lhe rende a frutificação no tempo certo. O acompanhamento zeloso do Senhor pelo justo lhe proporciona resultados concretos de suas ações. O justo dá os bons frutos de sua justiça, tanto no caráter como na conquista de seus objetivos. E tais objetivos são, ao mesmo tempo, modelados por Deus para que se adequem à sua vontade maravilhosa, o que, para o justo, é exatamente o que significa sucesso. A alegria do justo está na vontade de Deus, de forma que o sucesso do justo corresponde ao desejo do Senhor. Em outras palavras, o justo prospera no que faz. Seus empreendimentos dão resultados altamente satisfatórios e transbordantes de bênçãos.

            O ímpio é descrito nas características omissivas do justo. Isto é, ele é cheio de sabedoria carnal, caminha na estrada do pecado e zomba daqueles que fazem a outra escolha. O castigo do ímpio é ser levado como a palha. Ele não tem fundamento algum, mas é perdido nas circunstâncias e é abatido pelas dificuldades que o seu próprio caminho lhe trouxe. Muito facilmente é derrotado pelas consequências de seus atos tolos. Por isso, o ímpio é vencido pelo justo. Não há esperança para o perverso quando o íntegro se coloca contra ele. A figura do tribunal é uma boa metáfora para a vida. Deus está do lado da justiça e da retidão, e ele sustentará a posição dos justos enquanto provoca a queda dos maus. O conflito entre o bem e o mal é seguido pela vitória do bem.

            Resumidamente, o motivo da vitória dos justos é que eles são observados, cuidados e aprovados pelo Senhor, o Eu Sou que com eles fez uma aliança; do outro lado, os perversos estão abandonados e solitários para seguirem o caminho da destruição. Sem a dispensação do favor de Deus, o homem sozinho fatalmente se matará. Viver sem Deus é condenar-se ao suicídio.”

André Duarte

Nenhum comentário:

Postar um comentário