Chegou o
domingo, lá vamos nós para o culto. Quando pensamos em “culto”, a primeira
coisa que nos vem à mente é o sermão (ou “mensagem”, para os renovados). O
culto como um todo é avaliado pela qualidade do sermão. Em realidade, o sermão,
como pregação da palavra de Deus, é o momento central da edificação da Igreja.
Sabemos que “a palavra de Deus não volta vazia” (Isaías 55) e que a palavra é
viva e eficaz (Hebreus 4). Sabemos que devemos prestar máxima atenção ao sermão,
a fim de retermos o que “Deus quer nos falar hoje”. Com esses pensamentos,
estamos pressupondo que, de fato, o que está sendo pregado é palavra de Deus
mesmo, e não de homens.
Mas esse
pressuposto frequentemente é frustrado. Ora, é fácil perceber a terrível
decadência das igrejas hoje. E colocamos frequentemente a culpa nas pregações.
Sabemos criticar pregações extremamente hereges, como as de “teólogos” da
prosperidade, ou as ofertas de “venha para Jesus e pare de sofrer”. Mas a nossa
visão precisa ser um pouco mais ampla. Esse não é o único desvio possível das
pregações. Essa não é a única forma de pregar palavras humanas, e não as de
Deus. Não é qualquer sermão baseado num texto bíblico, com uma interpretação
mais ou menos razoável, que pode ser considerado edificante. Ao dizer que um
sermão é edificante ou não, antes que eu seja mal compreendido, refiro-me à
responsabilidade humana ao pregar, não à graça de Deus que pode efetuar
edificação mesmo pelo pior dos sermões.
Vamos
pensar numa situação não tão extrema. Como as aplicações bíblicas nas pregações
costumam ser feitas? Eu diria que há duas maneiras de fazer pregações não
cristocêntricas: autoajuda e moralismo. Em “pregações de autoajuda”, estão
aquelas que falam apenas no amor de Deus: em como ele cuida de você, em como
ele o capacita a vencer na vida, em como ele tem planos maravilhosos para você,
como você pode ser feliz e ser o máximo da autoestima, como ele protege você
dos perigos, etc. Já as pregações de moralismo são aquelas em que o pregador
“desafia” você a, a partir de hoje, cumprir um certo mandamento em que você
supostamente está falhando. São as que conclamam o público a fazer um grande
esforço moral para obedecer a Deus. São as que apenas dizem o que você deve
fazer e o que você não pode fazer, e deixam você com aquela reflexão sobre
alguma falha moral que você ainda tenha. O problema dessas duas pregações é que
elas dispensam a necessidade do evangelho. Mesmo que a pregação seja ortodoxa,
ela não fala sobre Jesus e sobre a graça. Sermões como esses não são
edificantes.
Como fazer
uma pregação realmente cristocêntrica? Em primeiro lugar, você precisa retirar
das pessoas a sensação de capacidade para salvar a si mesmas. Não é como se o
crente pensasse conscientemente “ah, se eu fizer o que o sermão está mandando,
serei salvo”, mas, para um número incrivelmente grande de crentes, a salvação
pela graça é apenas uma abstração na qual eles têm de acreditar. O coração é altamente enganoso neste ponto. Você
pode afirmar que é um pecador salvo pela graça, mas, lá no seu coração, você
está confiando e contando com o seu estilo de vida para ser justificado. O
pregador precisa afirmar de púlpito que você
não é capaz de cumprir aquele preceito moral. Você transgrediu aquele
princípio. O ouvinte precisa ser confrontado com a lei. Com isso, ele fica em
posição humilde e dependente da graça.
Além disso,
a pregação precisa falar sobre como Jesus cumpriu essa ordem moral por você.
Jesus foi o único que cumpriu toda a lei de Deus. Ele fez isso para que, pela
sua vida perfeita, você fosse perdoado de sua transgressão. E esse perdão
custou-lhe a vida. Ele teve de morrer para que você fosse perdoado, tamanha foi
sua transgressão. Veja, a cruz, na pregação, não serve só para dizer ao ouvinte
sobre como Deus o ama, mas sim sobre como isso foi custoso. Para nós, a
salvação é de graça, mas, para Deus, custou o seu Filho. A grandeza desse custo
é um reflexo da grandeza de nossa rebeldia. Na cruz, o homem é exaltado aos
céus e humilhado ao chão. Sermões de autoajuda falam apenas sobre o lado do
amor da cruz, não mencionando que tamanho sofrimento na cruz foi necessário por
causa da nossa maldade. Somos valorizados ao mesmo tempo em que somos
terríveis. E, por causa desse sacrifício de valor infinito, somos perdoados de
nossa transgressão e recebemos, em lugar da nossa justiça torta, a perfeita
justiça de Jesus, pela qual Deus nos recebe de volta. Além disso, sermões de
autoajuda repudiam o sofrimento. Tratam o sofrimento como falta de fé ou de
piedade. Ou então, no mínimo, tratam-no como algo estranho de que você precisa
ser liberto logo. E o sofrimento de Cristo? Ele não achou que o inimaginável
sofrimento dele – suportar a ira concentrada de Deus contra os pecados de toda
a humanidade, sem falar na própria cruz, açoites e espinhos – algo de que ele
deveria se livrar. Sofrer por ser inocente é louvável, como diz 1Pedro.
Sofrimento é totalmente adequado para a vida cristã. As circunstâncias difíceis
da vida do ouvinte não deve ser o centro da pregação, pois o ouvinte receberá
como deus em seu coração qual for o tema principal do sermão.
Em seguida,
vem a conclusão: porque Cristo cumpriu o mandamento em nosso lugar e nos serviu
como substituto, pela sua graça, pela sua obra santificadora, podemos enfim
cumprir esse mandamento. Veja, a obediência não vem de um esforço moral sobre a
vontade, mas sim do que Jesus fez por nós, aos nos capacitar e nos perdoar.
Você não busca a santidade porque você quer, consegue e precisa, e sim porque,
sendo você achado em falta na santidade, Jesus veio e conquistou a santidade
por você. Um sermão moralista tem a estrutura “este é o texto, este é o
mandamento, vá e obedeça”. Um sermão cristocêntrico diz “este é o texto, este é
o mandamento, esta é sua transgressão. Esta é a maneira pela qual Jesus cumpriu
o mandamento, este é o aspecto do seu sacrifício que perdoa você nessa
transgressão, e é assim que Jesus o ajuda a obedecer”. Quando o ouvinte
compreender que Jesus é o que importa em sua vida, não precisará mais de
sermões de autoajuda cuja ênfase recai sobre si mesmo. Jesus já nos deu toda a
ajuda que precisamos em sua obra. E conquistou para nós a santificação que os
sermões moralistas dizem para você conquistar.
Por que as
igrejas estão cheias de crentes moralistas? Em parte, porque os sermões estão
incentivando. Por que há tantos crentes desesperados e desorientados? Porque os
sermões de autoajuda colocam sobre o ouvinte uma necessidade de se angustiar
por algo que não tem importância alguma em comparação com a salvação dada por
Jesus. Somos acostumados a buscar na Bíblia palavras de consolo ou de
mandamentos morais e, assim, tornamo-nos egocêntricos em nossa compreensão
teológica. Sermões moralistas fornecem vitaminas de legalismo; sermões de autoajuda
fomentam o relativismo. Sermões que falam sobre o evangelho são o alimento de
um pecador salvo pela graça. Estamos enganados quando pensamos que sermões
sobre a salvação em Cristo são apenas uma lição básica para converter
descrentes. Na verdade, o evangelho é o norte de toda a vida cristã, em todos
os seus aspectos.
Vamos a
alguns exemplos. Ao pregar sobre Romanos 14, não diga que “precisamos ter união
e pronto”. Diga que havia uma separação, baseada em conceitos humanos, e que
Jesus, ao receber fariseus e flagrantes pecadores, ricos e pobres, judeus e
gentios, não fez entre eles acepção. E, ao dar a sua vida por todos esses
tipos, removeu a inimizade natural entre os homens. Por meio de Cristo, os
irmãos, por mais diferentes que sejam em pontos periféricos da vida, podem se
unir em torno do amor. Porque Jesus mostrou o que realmente importa em seu ato
sacrificial universal, não precisamos mais buscar significância em opiniões
particulares criadas por nós mesmos.
Em Davi e
Golias, não pregue que você deve ser como Davi, corajoso e destemido, para
vencer os gigantes na vida. Lembre-se, o herói da história é Jesus, nunca é
você. Você é como os israelitas que estavam morrendo de medo daquele gigante.
Davi foi o homem que arriscou a sua vida para dar vitória ao seu povo. Jesus
foi ainda mais grandioso, porque ele não apenas arriscou a vida dele, mas
realmente deu a sua vida. Jesus foi triunfante sobre o maior dos gigantes, o
pecado e a morte. E o seu triunfo nos é imputado.
Em
1Coríntios 6, a lição da história não é “não profanem o seu corpo cometendo
imoralidade”. O centro do ensino de Paulo é “vocês foram comprados por alto
preço”, e então ele dá a consequência “portanto, glorifiquem a Deus com o seu
corpo”. Veja, não há lição bíblica que não dependa do que Jesus fez por nós. A
pregação sobre esse texto deveria ser assim: todos nós transgredimos a lei ao
usar o nosso corpo para nossos próprios prazeres errados. Jesus Cristo, ao
contrário, ofereceu o seu corpo para cumprir a vontade de Deus integralmente. E
a sua oferta foi muito mais penosa do que a que foi requerida de nós. Deus
nunca pediu para que oferecêssemos nossos corpos para morrer em uma cruz, e
ainda assim nós ignoramos seus mandamentos. Mas Cristo glorificou a Deus com o
seu corpo até o fim. Ele deu o seu corpo para ser açoitado, rasgado e pregado
numa cruz, e depois ressurgiu em um corpo renovado. Por meio de Jesus, podemos
nós também oferecer nossos corpos para a vontade de Deus. Por causa do que ele
fez, temos também a esperança de ter nossos corpos renovados para servirmos a
Deus eternamente, o que retira de nós a necessidade de fazer tudo para nós
mesmos. Não estamos mais presos no “aqui e agora”. Não precisamos mais temer
que a vida passe e que não tenhamos dado prazer suficiente a nós mesmos. A
partir da purificação efetuada por Jesus, temos prazer em Deus para sempre com
nossos corpos.
Ao pregar
sobre Jonas, não dê simplesmente a lição “obedeça a Deus”. Pregue que Jesus é o
Jonas que realmente foi lançado fora às profundezas da terra para aplacar a ira
de Deus sobre nós. Jesus é a oferta que desvia o furor de Deus sobre nós, os
pecadores. Agora, podemos nos achegar a Deus como filhos, sem pavor. A história
de José não é um ensino “não cometa adultério, e no final vai dar tudo certo”.
É uma ilustração do próprio Jesus, que foi rejeitado pelo que eram seus, mas
que, após sofrer injustamente, governa à direta do Rei e salva aqueles que o
traíram - nós. Jesus é o melhor Abraão, que viveu em fé sem jamais vacilar, cumprindo
a vontade de Deus e, por consequência, a própria aliança iniciada no patriarca.
Jesus é o verdadeiro tabernáculo, o templo, o rei, o profeta, o sacerdote, o
pão que desce do céu, a água da vida, o cordeiro pascal, o maior missionário, o
mediador de uma nova aliança, o logos do universo, o guerreiro que oferece sua
vida para dar vitória ao seu povo, o verdadeiro tesouro, o maior mestre, o
pleno descanso sabático de nossas obras, o anjo que executa juízo sobre a
Jerusalém ímpia, a luz dos gentios, o máximo do sofrimento inocente, o
sacrifício purificador e definitivo, o holocausto que nos move à gratidão, a
perfeita imagem de Deus.
A Bíblia
não é sobre o que você deve fazer, e sim sobre o que Deus fez por você. As
pregações precisam ser feitas assim. Repare em quantos sermões são feitos sem
mencionar “Jesus”, “graça”, “pecado”, “cruz”, “ira”, “redenção”, “regeneração”.
Precisamos voltar a reconhecer o evangelho como o centro do culto. Pois Cristo
é o Cabeça da Igreja, em torno do qual devemos nos ajuntar em submissão,
humildade e gratidão.
André
Duarte
A Paz irmão André, que benção, que lindo,que profundo...tocou em minha alma esta mensagem, gostaria de levar a Palavra de Cristo assim, realmente Jesus está em toda a Palavra. Eu realmente nao sei como me expressar!..Que benção. Se puder dar mais ajuda é uma serva que gostaria de todo coração levar a verdadeira Verdade, me informe: perola_negra@ymail.com Que a Graça do Senhor esteja Contigo sempre!
ResponderExcluirDe fato muito esclarecedor!!
ResponderExcluirExcelente muito edificante, é realmente o que está acontecendo nas igrejas e ninguém percebe que estão tirando Jesus das pregação. Muito bom obrigado Pastor. joseluiz60@hotmail. com. A PAZ DO SENHOR JESUS.
ResponderExcluirmaravilhoso.
ResponderExcluirGloria a Deus
ResponderExcluirMuito bom o estudo
Deus abençoe!!!
Caro irmão, eu quero aprender mais sobre pregação cristocêntrica, me ajude.
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