Este belíssimo salmo de Davi é
um louvor quase extático pelo contraponto entre a grandeza de Deus, a pequenez
humana e a incompreensível resolução para ambas: o amor de Deus pela
humanidade.
Primeiro, Davi é
espiritualmente surpreendido pela soberania real de Deus. Ele exclama “como é
majestoso o teu nome em toda a terra”. Deus é o rei que revela a sua glória em
todo o mundo. Ele louvado nos céus pelos anjos, devido à maravilha de sua
perfeição manifestada em sua criação. Deus é o supremo artista e arquiteto,
cuja obra é testemunho do seu grande poder e de sua infinita sabedoria. E o
salmista vai além, declarando que Deus intervém na sua criação, fazendo-se
conhecido entre os menores humanos – crianças e recém-nascidos. Deus protege os
pequenos e indefesos, fazendo do seu nome motivo de segurança e dependência, o
que resulta em louvor e adoração. Assim, os ímpios são derrotados por Deus, com
o fim de que os humildes que se beneficiam dessa defesa glorifiquem o Senhor.
Essas duas constatações – a
intervenção de Deus em favor dos indefesos e a grandiosidade do seu poder
criador – levam o salmista a se embasbacar com o amor de Deus pelos homens.
Deus criou coisas magníficas, como as estrelas, o sol, a lua, o céu. Tendo em
vista essas criações belíssimas e imponentes, o homem parece insignificante. O
homem é das menores obras de Deus. O salmista, entretanto, acabara de perceber
a atuação de Deus pelos homens em favor dos indefesos e contra os perversos.
Por que, ele pergunta, Deus se importa com os homens? Por que um Deus tão
grandioso daria tanto valor a seres tão pequenos? O salmista sabe muito bem que
Deus não precisa dos homens. Ele é suficiente em si mesmo. Poderia ele deixar a
humanidade descuidada, tal qual o homem que não se importa com formigas. O
homem é imensamente inferior a Deus. Como isso contrasta com a ideia humanista
de que o homem é o maior dos seres! Em seu orgulho, os homens adoram os seus
próprios pensamentos, considerando-os da maior sabedoria. Adoram seus
sentimentos, pensando que eles são o que há de mais valioso. Adoram suas
próprias obras, pensando que cada feito tecnológico, cada nação governada, cada
poder militar é o que há de melhor. Em tudo isso, os homens ignoram o Deus que
criou o universo. A ignorância e a pequenez do homem, tal qual a criança
malcriada fazendo birra, resultam em desprezar Deus. Mas, Deus, que é o supremo
rei da terra, que tem todo o direito de fazer aos homens o que eles fazem
contra ele, em vez disso, demonstra amor pela humanidade. Isso é impressionante
e incompreensível.
O salmista também percebe essa
realidade do amor com base no próprio relato da criação escrito por Moisés.
Deus colocou o homem como o dominador da terra. Debaixo de sua autoridade, está
o resto do mundo. Esse é um direito que deveria ser recebido em espírito de
adoração e gratidão a Deus, pois de forma alguma o homem é digno de comandar a
terra. Por causa do pecado, ele se tornou um péssimo dominador, arrasando a natureza
que Deus criou. Em vez de governar o mundo com temor a Deus, o homem o faz para
a sua própria glória e, consequentemente, para a sua própria desgraça. Por
isso, Paulo diz, em Romanos 8, que a natureza aguarda com grande expectativa o
juízo de Deus, para que ela seja restaurada.
Importante a declaração de
Davi de que o homem foi feito um pouco menor que os anjos. Não pode significar
“menor que Deus” por dois motivos: primeiro, porque o salmo inteiro enfatiza
justamente o quanto o homem é muito
menor do que Deus; segundo, porque a citação em Hebreus prefere a tradução
“menor que os anjos”. Essa citação nessa carta leva à maior surpresa e
incompreensão com que o salmista jamais sonhou. Ora, Davi está perplexo pelo
amor de Deus aos homens, que, embora pequenos e estúpidos, são exaltados por
Deus para governarem a criação e para participarem da atuação graciosa de Deus
sobre eles. O que o salmista pensaria, então, se conhecesse Jesus? A citação em
Hebreus diz que esse salmo se cumpriu em Jesus também, pois Jesus tornou-se
homem, menor do que os anjos, como qualquer outro homem. Entretanto, o homem
comum já foi criado menor que os anjos. Jesus, em sua eternidade, é o próprio
Deus supremo que corresponde ao Deus deste salmo, embora Davi não compreenda
isso. Assim, Jesus estava acima de qualquer criação, inclusive os próprios
anjos. Mas, em seu imenso amor, Deus tornou-se homem, rebaixou-se à condição de
servo e assumiu o papel que, segundo este salmo, é diametralmente oposto ao
papel soberano de Deus. O amor de Deus ao homem é demonstrado não apenas por
tê-lo revestido de glória e honra com relação à criação, embora o homem fosse
tão pequeno, mas em ele próprio ter assumido essa pequenez para salvar a
humanidade. O Deus supremo encarnou em um servo humano, menor do que anjos,
movido pelo seu amor, a fim de resgatar a humanidade para a libertação do
pecado. Em Cristo, o homem pode, finalmente, cumprir o seu propósito de andar
em temor a Deus, respeitando as suas obras e grato pelo seu amor. Como diz
Paulo, “nisso está o amor de Deus: Cristo morreu por nós quando ainda éramos
pecadores”.
Diante disso, não há o que
falar, a não ser o próprio suspiro do salmista: “Senhor, Senhor nosso, como é
majestoso o teu nome em toda a terra!”
André Duarte
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