quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Relacionamentos amorosos: uma análise à luz da Escritura - I



Vamos continuar aqui o assunto proposto anteriormente: o de falar sobre relacionamentos conjugais à luz da Escritura. Vemos, então, que uma grande falta da Igreja hoje reside em faltar para com uma interpretação bíblica robusta sobre o assunto, prendendo-se a questões e versículos pontuais. E isso acaba gerando o que também foi apresentado no post anterior da série: uma geração descontrolada de regras, que não contemplam a verdade bíblica sobre o assunto, o “cimento” que une as regras e lhes dá propósito.

Disse também que abordaria de uma maneira “de cima para baixo”, e aqui começa isso. Antes mesmo de nos perguntarmos “o que pode e não pode”, “o que se deve fazer”, devemos primeiro pensar em algo sobremodo superior: a nossa finalidade, o porquê de termos sido criados pelo próprio Deus, o objetivo de nossa existência. Com base nisso, teremos uma luz mais clara sobre o propósito e limitações dos relacionamentos conjugais.

Existe um certo documento cristão¹ que faz uma série de perguntas e respostas acerca de vários pontos da fé cristã. Entre elas tem um interessante item, que se vê a seguir:

“Qual é o fim supremo e principal do homem?
Resposta. O fim supremo e principal do homem e glorificar a Deus e gozá-lo para sempre.”

Essa afirmação é verdadeira. A finalidade da humanidade, a razão de existir reside nisso: glorificar a Deus e gozá-lo para sempre. E é isso que devemos almejar, esse é o objetivo de nossa existência, e, se esse é o objetivo de TODA a nossa existência, então TODOS os aspectos da nossa vida tem que ser voltar para Deus e o que Ele requer. Esses aspectos da nossa vida existem em imagem e semelhança aos aspectos do próprio Deus, ainda que em analogia, e têm como objetivo glorificá-Lo. Dentre estes aspectos da vida poderíamos citar: trabalho, estudos, lazer, comércio, política, arte, ciência, relacionamentos conjugais e família, etc. Todas estas áreas da existência, e mais outras, devem glorificar a Deus; em tudo, tem que existir os princípios divinos regendo-as e retificando-as.

Entretanto, uma pergunta fica: como se pode glorificar a Deus nessas áreas? Qual é o princípio maior, o padrão maior para tal? Uma resposta dentre muitas, visto seus vários enfoques, é analisar a humanidade em relação à sua imagem e semelhança de Deus (Gn 1.27; 9.6), uma doutrina um tanto quanto posta de lado pela Igreja. A humanidade, ao contrário de todo o resto da Criação, foi criada à similitude do Criador; é sua imagem perfeita. Ainda que não sejamos como Deus por completo, somos semelhantes a Ele por analogia.

Vários exemplos ilustram essa realidade:

1.    1.   Nós trabalhamos, porque, desde o Éden, temos o mandato de trabalhar, de dominar a terra e tudo que nela há (Gn 1:28), como mordomos da Criação para o Grande Rei. Isso se dá justamente porque Ele também trabalhou na Criação, a sustenta, e continua operando nela, fazendo d’Ele o Trabalhador Original no qual o homem é apenas trabalhador por semelhança. O trabalho não existe por si só, mas serve a um propósito, o de produzir sustento e exercer domínio sobre a terra; trabalho por trabalho acaba se tornando pecado, como workaholics vivem, por exemplo.

2.    2.   À semelhança de Deus, nós também descansamos, porque Ele mesmo descansou no sétimo dia, e é o momento onde contemplamos o fruto das obras de nossas mãos, assim como no sétimo dia da criação Ele folgou e viu sua obra completa (Gn 2.2,3). Se o descanso passar disso, como a preguiça, como a procrastinação, é erro crasso e deturpação do propósito divino do descanso em nós.

3.    3.   Os pais só o são porque Deus mesmo é Pai (Mt 7.11), e da Paternidade dele se deriva e se modela toda paternidade humana; toda Filiação, de Deus também se deriva, porque Deus também é Filho (Sl 2.7), e todo filho tem por molde o Filho Eterno.

Assim, glorificamos a Deus quando nos voltamos para Aquele de quem nós somos imagem e agimos de acordo com a semelhança divina que temos em nós. Assim, imitaremos o Criador, seremos santos como Ele é santo (Lv 20.26), e teremos alegria e comunhão com Ele.

Um ponto a se notar aqui, como falei de leve acima, há o pecado. Desde a queda da humanidade no Éden, o pecado e a morte entraram no mundo e na vida humana, corrompendo-os por completo. A perfeita imagem e semelhança do Deus Triúno foi corrompida na Queda. Desde então, temos nenhuma aptidão para a santidade, antes, total inclinação para o pecado e o mal. Isso vai se aplicar, visto nossa imagem deturpada, a todas as áreas da nossa vida. Por exemplo, trabalho pode virar vício ou crime, o descanso vira preguiça, a política vira corrupção e egoísmo.

A única solução para isso é a fé em Jesus Cristo e seu sacrifício na Cruz. A Epístola de Paulo aos Colossenses vai dizer que “havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele, reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus.” (Cl 1.20). Em Cristo, todas as coisas são reconciliadas, tudo começa a ser restaurado, tendo sua completude no mundo vindouro. Nossa santificação é a restauração da imagem e semelhança de Deus em nós, que começa com nossa regeneração e se completa na glorificação (quando seremos como anjos nos céus – Mc 12.15; 1 Co 15.35-54). Assim, tornando-nos co-participantes da natureza divina (2 Pe 1.4), com o próprio Espírito Santo de Deus habitando em nós, somos redimidos de nossos pecados, indo em direção à glorificação futura, a redenção completa, no mundo vindouro, tornando-nos mais do que nossos primeiros pais o foram: seremos como Cristo Jesus assunto aos Céus.

O que relacionamentos conjugais têm a ver com tudo isso?

Bem, vimos que tudo da nossa vida serve pra glorificar a Deus, inclusive esse tipo de relacionamento. Analisamos também que somos imagem e semelhança de Deus, e que O glorificamos quando, pelo Espírito que nos santifica, agimos de acordo com a similitude original. Semelhança essa que é o que Deus nos propôs a ser, como Ele próprio O é, ainda que por analogia. Então, o que há em Deus que temos de semelhante, que se reflita em relacionamentos conjugais? O relacionamento de Deus por Seu povo, que se reflete na humanidade na figura do casamento. Esse relacionamento Divino-humano é uma aliança, um pacto, fundado em amor e compromisso, bênçãos e responsabilidades. E o maior exemplo disso está na Epístola aos Efésios, na figura de Cristo e a Igreja.

É pelo casamento que glorificamos a Deus nos relacionamentos conjugais. O casamento existe PORQUE existe antes o relacionamento de Deus e seu Povo todo, antes mesmo da fundação do mundo (1 Pe 1.20; Ap 13:8; Ef 1.4). Assim, todo e qualquer relacionamento conjugal entre homem e mulher tem que visar e andar para o casamento, e nele viver de modo santo e correto, senão, incorrerá em pecado e necessidade de arrependimento. E é disso que trataremos no próximo capítulo dessa série.

Que Cristo abençoe a todos nós.


Marcel Cintra


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